Entre arte, turismo e propósito: Erik Sadao, autor do livro ‘Os Movimentos Artísticos que Moldaram Benelux’, fala sobre sua trajetória e o impacto da Panamericana em sua jornada
Apaixonado por arte, movido pela curiosidade e com um olhar atento às conexões entre passado e presente, Erik Sadao construiu uma trajetória singular no universo do turismo. Fundador da Sapiens Travel, uma agência que cria experiências de viagem baseadas na história da arte e na cultura local, Erik é também autor do recém-lançado ‘Os Movimentos Artísticos que Moldaram Benelux’.
Executivo, guia, pesquisador, escritor e, como ele próprio define, um eterno buscador, Erik se declara um polímata, à moda renascentista. Seu trabalho conecta mundos: o do viajante e o da cidade, o do passado e o do presente, o da cultura e da contemplação. E esse fio condutor teve início dentro de uma sala de aula da Panamericana – Escola de Arte e Design.
Com formação em comunicação e marketing e uma sólida carreira no setor de turismo de luxo, Erik decidiu, em um momento de transição, buscar na arte uma nova maneira de ver o mundo e de se conectar com as pessoas. Estudar na escola foi o primeiro passo: “Eu era um menino da periferia e sonhava em estudar na Panamericana desde que via os anúncios. O meu primeiro presente que me dei com salário foi assinatura de jornal e revista. E a Panamericana, eu via na Folhinha, na Veja, em todo lugar. Eu assistia ao comercial e babava, eu sonhava em estudar lá”, relembra.
Anos depois, já com um currículo de peso e experiências internacionais, realizou esse desejo e encontrou nos cursos de História da Arte da escola um divisor de águas. Mesmo tendo feito outros cursos, foi a Panamericana que despertou nele algo especial. “Ela tinha um quê que eu não sei… mexeu comigo na adolescência. Aquela coisa de entrar na escola e sair diferente, ver o mundo de outra forma.” Anos depois, já morando perto da escola, ele finalmente realizou esse desejo. “Foi um dos melhores anos da minha vida. Acrescentou tanto, mudou o meu jeito de ver tudo.”
A arte como ferramenta de transformação
Erik cresceu na Zona Leste de São Paulo e começou a trabalhar cedo. Aos 14 anos, já atuava em uma locadora de vídeo. Dotado de memória fotográfica, logo se destacou por gravar sinopses, datas de produção e nomes de diretores com facilidade. A paixão por música, cinema e, mais tarde, por arte, cresceu com ele. “Sempre fui doido por música, doido por cinema. Aos poucos, fui descobrindo a arte e me apaixonando por esse universo.”
Depois de uma década atuando na South African Airways, onde chegou ao cargo de gerente de marketing, Erik decidiu mergulhar nos estudos. Formou-se em publicidade na Belas Artes com altas notas em História da Arte e logo percebeu que poderia usar esse conhecimento para enriquecer sua atuação no turismo. “Publicidade era uma máquina de moer criatividade, não era pra mim. E foi quando surgiu a oportunidade de trabalhar na Teresa Pérez, uma das principais agências de turismo de luxo do país.”
Na Tereza Pérez, liderou projetos inovadores. “Transformamos a brochura institucional em uma revista com conteúdo editorial, eventos e profundidade cultural. Mas sentia que os consultores precisavam de algo mais: repertório.” Foi nesse contexto que buscou a Panamericana. “Queria dar uma formação mais sólida para minha equipe, e os cursos me ajudaram demais a criar um novo modelo de atendimento.”.
Erik conta que fez dois cursos diferentes de História da Arte na Panamericana: um com foco linear, que traçava uma linha do tempo da arte do Egito Antigo à Contemporaneidade, ministrado por Giovanni, professor que se tornaria uma de suas principais referências, e outro com abordagem não-linear, que relacionava a arte aos contextos históricos e tecnológicos de cada período. “Esse segundo curso me marcou muito. Foi nele que comecei a pensar as visitas guiadas que faço hoje, como as do Van Gogh Museum. Levo o cliente a imaginar o contexto de mundo da virada do século XIX. O que estava acontecendo? A fotografia, a psicanálise, a invenção do tubo de tinta… Tudo isso influenciava o olhar das pessoas. Essa visão foi moldada ali, naquele curso.”
A passagem pela escola não apenas impulsionou sua carreira como profissional do turismo, como também despertou uma vocação que ele ainda não sabia que tinha. “A Panamericana abriu minha cabeça. Me endossou numa coisa que eu já sabia que existia em mim. Me ajudou a enxergar que a arte podia ser mais do que uma paixão, podia ser um instrumento de transformação no meu trabalho e na minha vida.”
Após terminar os cursos da Panamericana Erik se mudou para Amsterdã e deixou para trás os anos de atuação no mercado brasileiro para fundar a Sapiens Travel. A proposta é diferente de tudo o que se via no turismo tradicional: em vez de roteiros genéricos e visitas rasas, a agência oferece experiências imersivas, com foco em arte, história e cultura. “Eu quis criar um negócio em que os guias conversassem, não dessem palestras. Em que não houvesse microfones nem guarda-chuvas levantados. Queria troca, conexão verdadeira.”
Hoje, seus itinerários vão além dos museus famosos e incluem visitas a espaços pouco conhecidos, como o Depot Boijmans Van Beuningen, em Rotterdam, um museu que expõe suas obras como se fosse um depósito, usando os cavaletes transparentes de Lina Bo Bardi. “É impressionante. Você vê Bosch, Van Eyck, Rubens em um espaço que subverte completamente a lógica tradicional. E esse tipo de lugar é o que quero apresentar para os meus clientes”, diz.
A base conceitual do trabalho da Sapiens vem de uma ideia poderosa: é preciso olhar para trás para entender o presente. “A arte é o melhor antídoto contra o excesso de conectividade e ruído que vivemos hoje. A contemplação, o silêncio, a conexão com a beleza e o pensamento são vitais. E o turismo pode, sim, ser uma ponte para isso.”
Em 2024, Erik realizou outro sonho: publicou ‘Os Movimentos Artísticos que Moldaram Benelux’, um livro que mistura conhecimento histórico e curadoria de experiências. Resultado de oito anos de pesquisa, o livro traz uma perspectiva única sobre a produção artística na Bélgica, Holanda e Luxemburgo, regiões muitas vezes negligenciadas nos manuais tradicionais de arte. “Benelux é um território pequeno, mas produziu uma quantidade absurda de arte. Eu quis saber as raízes disso, e fui me aprofundando.”
A publicação, que nasceu como material promocional para a empresa, ganhou corpo e foi lançado com uma noite de autógrafos prestigiada por mais de 400 pessoas. Parte das vendas foi revertida para levar 200 crianças da periferia de São Paulo para visitar exposições de arte, por meio da ONG Inspirar-te. “Esse foi o verdadeiro prêmio. Democratizar o acesso à arte sempre foi um desejo meu, porque eu sei como esse acesso pode mudar a vida de alguém”, comemora.
É exatamente esse olhar sensível para a arte que se reflete no compromisso que Erik leva para além das experiências de viagem: o de tornar o conhecimento mais acessível. “Eu venho de uma origem mais simples, sei como é importante a democratização da linguagem e do conhecimento. Muitas vezes, a erudição cria uma distância de quem está recebendo a informação”, afirma. Por isso, ele faz questão de manter uma abordagem empírica e envolvente, tanto em seu livro quanto nas experiências que oferece pela Sapiens. “A contemplação é muito importante para a nossa formação. E a arte é quase como um código secreto que a gente usa para entender tudo”.
Embora sua atuação atual não esteja diretamente vinculada ao mercado da economia criativa, Erik é a prova de que o repertório construído em cursos como os da Panamericana pode ser transformador, independentemente da área profissional. “Na época em que sofri com depressão, quando saí da Teresa Pérez e perdi o conforto que o cargo me dava, foi a história da arte que me salvou. E foi a Panamericana que plantou essa semente”. Para quem busca dar novos sentidos à sua trajetória, ele deixa um conselho: “A formação em arte é um repertório que pode ser usado em qualquer área. Mesmo que você tenha uma oficina mecânica, dá pra usar. Mesmo que sua função seja adaptar campanhas prontas de uma multinacional, esse olhar pode mudar tudo”.