Museu do Isolamento reúne virtualmente artes visuais criadas durante a pandemia

Criado com intuito de abrir espaço para pequenos artistas, o primeiro museu totalmente digital do Brasil reúne mais de 1300 trabalhos que dialogam com o momento atual

Durante pandemia, ao longo do último ano, com museus e espaços culturais fechados ou com funcionamento limitado, a arte precisou encontrar novos caminhos para se exibir. O momento delicado acabou por gerar uma intensificação de diferentes dinâmicas de exposições de arte, e novas obras passaram a retratar reflexões sobre a própria produção artística, sobre o mundo atual e as transformações em curso. 

Foi nesse contexto que a produtora de conteúdo Luiza Adas criou o primeiro museu totalmente digital do Brasil. Nascido em abril de 2020, o Museu do Isolamento Brasileiro está hospedado no Instagram e possui um acervo colaborativo de cerca de mil e trezentas obras. Graças ao seu trabalho no Florindo Linhas, uma página criada por ela para divulgar conteúdos sobre arte e cultura de maneira acessível e democrática, a jovem de 23 anos percebeu a necessidade de se conceber um espaço para que os artistas menos conhecidos do grande público, que foram os mais afetados pela pandemia, pudessem expor seus trabalhos. 

“Já era difícil que pequenos artistas tivessem um espaço de visibilidade, em que conseguissem vender, falar sobre seus trabalhos e alcançar novos públicos antes da pandemia. Em um momento de isolamento social isso se agravou ainda mais. Pensando nisso, eu tive a ideia de criar o Museu do Isolamento como um espaço de visibilidade para esses artistas”, conta Luiza. 

A curadoria das obras expostas no museu é feita a partir do que pode ser relevante para as pessoas em relação à arte, cultura, política, questões sociais. “Nunca coloquei o assunto Covid-19 ou pandemia como um tema necessário para ser debatido na página porque eu entendi que pessoas estavam produzindo coisas que iam além do coronavírus. Eu pensei em um espaço para que os artistas pudessem compartilhar obras de arte que falassem sobre o que eles vivem. Na medida em que o tempo foi passando eu fui entendo que, mais do que falar sobre esse momento, o Museu do Isolamento estava se propondo a ser um museu do agora. Ele é sobre os acontecimentos presentes. A gente tem uma rapidez para expor obras de arte que falam sobre coisas extremamente atuais e, mais do que qualquer coisa, retratam os diferentes tipos de isolamentos existentes no mundo, não só isolamento social decorrente da pandemia. No Brasil, temos isolamento regional, econômico, cultural e social. Então o Museu do Isolamento começou a se redesenhar para falar sobre todos esses temas relevantes e ele é assim até hoje”, explica a fundadora. 

Atualmente, o Museu do Isolamento tem mais de cento e dez mil seguidores no Instagram e já fez parcerias com marcas importantes como a Farfetch, Converse e Avon, coisa que Luiza não planejou quando teve a ideia do projeto. “É muito maluco porque as pessoas acham que eu fiquei idealizando o projeto e depois comecei a estruturar o museu e na verdade não foi nada disso. Eu simplesmente tive esse estalo durante uma sessão de terapia. Percebi que essa era uma maneira ajudar as pessoas. Eu havia feito uma pesquisa na faculdade sobre comunicação estratégica de museus para captação de públicos, e simplesmente resolvi utilizar o trabalho de pesquisa para criar meu próprio museu e para ajudar pequenos artistas a terem esse espaço para ecoar suas vozes. Na mesma hora eu entrei no Instagram para ver se o arroba estava disponível e comecei a mandar mensagens para os artistas que eu admirava, sem nenhum planejamento. Em duas semanas eu tinha mais de 10 mil seguidores e um monte de gente compartilhando. Tudo aconteceu muito rápido, mas não houve um processo de estruturação claro. As vezes só criar, sem pensar muito, é o que pode dar o ‘start’ para gente conseguir estar ‘on time’ para realizar. Eu criei a página e conforme o projeto foi tomando forma, fui corrigindo e acertando, fazendo tudo que era necessário para que ele se tornasse mais próximo do que eu queria”, revela.

Formada em Relações Públicas e encantada por arte desde criança, Luiza acredita que, neste momento em que estamos vivendo, o Museu do Isolamento e as obras de arte são um caminho para que as pessoas possam respirar, conversar e questionar. “Se antes a gente podia ir às ruas e conversar com as pessoas, refletir sobre o que estava acontecendo por meio da troca de ideias, hoje em dia a gente não tem, apesar de existirem as redes sociais, mais esse contato tão próximo reflexivo. Então eu acho que a arte tem exatamente essa função de trazer isso pra gente, esse olhar, essa reflexão, esse outro ponto de vista, essa crítica. Ela nos ajuda a entender e lidar melhor com o que estamos passando, seja em termos de sociedade e coletivo, ou em termos de individualidade, do que se passa dentro da gente. Na verdade, a arte sempre teve essa função, mas em um momento como esse, tão delicado, que a gente não consegue ver as pessoas, isso ganha uma potência maior e as pessoas acabam recorrendo à arte como uma forma de respiro e reflexão”, diz ela. 

Além da importância que tem como espaço democrático para pequenos artistas e de discussão de inquietações sociopolíticas, isolamento, incertezas, descobertas e autoconhecimento, o Museu do Isolamento também tem como um de seus propósitos extinguir barreiras e unificar pessoas, conectando artistas de regiões muito diferentes em torno de uma única causa. “Acho que o museu fomenta um pouco essa ideia de que a precisamos olhar de novo e repensar como é a comunicação e como a inserção das pessoas nos museus convencionais vem sendo desenvolvida. Precisamos entender de que forma a podemos incluir mais o público nos processos e trazer reflexões atuais, do aqui e agora, pra sociedade por meio da arte”, filosofa. 

Quem quiser expor seu trabalho no Museu do Isolamento, precisa apenas preencher o formulário disponível no link fixado na bio do perfil do Instagram, e aguardar que sua obra seja selecionada. “A curadoria é feita diariamente e não existem regras definidas sobre o que uma obra deve ou não ter para fazer parte do acervo do Museu do Isolamento. Existem algumas coisas para as quais a gente sempre se atenta, como a qualidade da imagem, se a reflexão faz sentido para o momento que estamos vivendo, e se de alguma forma ela traz elementos que conversem com outras obras que estão lá. O que a gente mais gosta de ter é a pluralidade de ideias e linguagens por isso tentamos mesclar da melhor forma possível essas obras de arte para ter uma curadoria diversa no Museu do Isolamento”, finaliza.

Gostou? Compartilhe!