Eduardo Srur recria obras de artistas famosos usando sacolas plásticas

O artista, conhecido por suas intervenções urbanas na capital paulista, trocou os pincéis por materiais descartados pela sociedade para promover reflexão.

Conhecido por suas intervenções urbanas na cidade de São Paulo, Eduardo Srur precisou se afastar das ruas durante a pandemia de Covid-19. Por conta da necessidade de distanciamento social imposta pela situação, o artista, que desde o início dos anos 2000 faz uso do espaço público para desenvolver instalações com diferentes linguagens visuais, voltou ao estúdio, onde recriou telas famosas de Cézanne, Van Gogh, Monet e Tarsila, sem usar tinta nem pincel.

Para reproduzir as obras famosas para a série “Natureza Plástica”, Eduardo usou sacolas plásticas recolhidas em ruas e rios de cidades brasileiras como matéria-prima: “Eu sempre enxerguei o mundo como pintor. A minha carreira se iniciou com a linguagem de pintura. Foi assim que eu ganhei os primeiros prêmios e tive um reconhecimento institucional. Com a pandemia e a escassez de propostas no espaço público – afinal, não era nem correto criar situações em que eu convidasse o público para visitar as intervenções urbanas -, eu voltei para o atelier. Posso dizer que eu reencontrei a mim mesmo e minhas origens. A grande diferença desta série é que eu aposentei os pincéis e as tintas e passei a pintar com plásticos. Transformei um material que a sociedade descarta e dá pouco valor em arte. Isso é altamente provocativo e promove uma reflexão sobre excesso, desperdício, erro de sistema e indústria. Está tudo envolvido nessa economia circular que eu estou propondo com essa série das sacolas plásticas. Eu estou ressignificando um objeto que foi descartado”.

A temática de conscientização sobre o meio ambiente é recorrente no trabalho do artista, que diz ser impossível se manter indiferente à questão vivendo em uma cidade como São Paulo: “Para um artista urbano que vive em São Paulo, uma cidade com 20 milhões de habitantes, cheia de erros e equívocos na paisagem, é impossível ficar indiferente. Meu atelier fica em frente ao rio Pinheiros, que é uma vergonha paulistana. O rio é um esgoto a céu aberto e cruza a nossa cidade rica e com recursos para a despoluição. Eu sempre vivi esse embate de ter um rio que não pode ser usufruído em frente ao meu atelier. Eu nunca pude fazer uma conexão de fato com ele e, por outro lado, eu gosto de surfar, gosto da praia e do mar. Então foi esse atrito que eu tinha entre sair e voltar para a cidade que provavelmente catalisou a minha primeira intervenção que se chama ‘Caiaque’. A partir dessa obra eu não consegui mais me desconectar de pensamentos que levassem a sociedade a refletir sobre esse nosso ataque ao meio ambiente, não só na cidade de São Paulo, mas em uma escala global. O meu trabalho hoje está bastante determinado em relação a isso, porque a forma como a gente destrói o nosso meio para sobreviver é algo que realmente me causa inquietação”.

Uma denúncia sobre centenas de árvores que caem todos os anos na cidade de São Paulo por motivos errados, inclusive, foi a temática escolhida para a obra ‘Árvore Caída’, que Eduardo criou em 2015 em parceria com a Panamericana. Para a intervenção, no parque do Ibirapuera, o artista replantou um eucalipto gigantesco de 10 toneladas e 20 metros de altura de ponta-cabeça. “Talvez essa tenha sido minha intervenção mais impactante, a que me tirou o sono, mais do que qualquer outra.  A obra tinha também essa questão de provocar o olhar em relação à paisagem distorcida da nossa cidade e apontar esses erros que a gente tem cometido com o meio ambiente”, relembra ele.

“Hoje eu sou um artista que vive na cidade. Se eu não tivesse realizado essas obras, talvez eu não estivesse em São Paulo, talvez vivesse na praia. Mas sinto que é meu dever voltar para São Paulo e alertar a sociedade, para também gerar esse oxigênio mental nas pessoas que vivem nesse cotidiano denso, que é o cotidiano de São Paulo. A cidade, na verdade, me moldou. As intervenções urbanas respondem à essa dinâmica, a essa organicidade da cidade de São Paulo, ou de qualquer outra metrópole no mundo. Eu penso que minhas obras, na verdade, são uma resposta a esse meio ambiente que foi forçosamente colocado no meu olhar”, explica Eduardo.

Gerar inquietação e reflexão, inclusive, é o principal papel da arte, acredita o artista. “A arte tem o poder de fazer as pessoas saírem de um estado de anestesia e, com sorte, terem pensamentos diferentes do que tinham em relação à realidade em que estão inseridas. Para mim, a questão estética pesa menos do que a questão conceitual. Eu sou um artista político porque eu desenvolvo obras que saem desse espaço institucional. O meu trabalho é gritar, denunciar, chamar atenção para problemas que interessam a você e a mim. Claro que isso não significa que meus trabalhos não tenham uma estratégia de convidar o olhar. Afinal é preciso aproximar o olhar do público para gerar reflexão. Então eu busco um equilíbrio entre esse aproximar o olhar e fazer as pessoas refletirem, se incomodarem com aquilo que está em frente a elas”, finaliza.

Gostou? Compartilhe!