Artista plástico relembra sua experiência marcante em curso intensivo da Panamericana

Anderson Augusto era autodidata até resolver se matricular na Panamericana em 1983. Da escola, ele guarda as melhores recordações e todos os trabalhos realizados em aulas

Quando decidiu fazer um curso intensivo de desenho e pintura na Panamericana, Anderson Augusto já desenhava. Autodidata, o artista plástico, criado na pequena cidade mineira de Muriaé, já havia tido alguns de seus trabalhos publicados na coleção “Revista da Historiografia Muriaeense” aos 15 anos de idade. Depois de entrar para um seminário e viajar com padres holandeses, decidiu se mudar para São Paulo onde estudou teologia.

“Foi quando eu descobri a Panamericana. Eu busquei por escolas de arte em que seria possível eu ingressar sem formação anterior, já que até então eu era autodidata. Como eu estava fazendo uma faculdade, tinha que ser um curso paralelo. Na época eu não tinha nem como pagar. Tive que pedir ajuda para um dos padres, que financiou o curso. Foi uma experiência fascinante. Foi uma breve, mas muito marcante, passagem pela escola. Guardo até hoje com muito carinho todos os trabalhos que fiz nas aulas, em 1983”, relembra ele.

Apesar do pouco tempo em que estudou na Panamericana, Anderson conta que usa até hoje em seus trabalhos as técnicas que aprendeu na escola e também as usou para ensinar outras pessoas: “Todo o início da parte de técnica de cores, em que a gente trabalhou o guache, o círculo das cores, as cores primárias, secundárias, e terciárias, foi bem elementar e muito útil para o meu trabalho. Os painéis que eu pintei na PUC de São Paulo, durante um curso de educação popular, foram baseados no que eu aprendi na matéria de introdução às cores. Sete anos depois eu usei todo esse material em um curso de desenho que ministrei na minha cidade quando voltei para lá. Tudo aquilo que eu aprendi na escola eu repassei pra uma turma. Inclusive, um desses alunos depois se tornou um artista, se desenvolveu. Foi muito interessante”.

O ambiente da escola também influenciou bastante nas boas memórias que o artista guarda do tempo em que estudou na Panamericana. Além do grupo de pessoas de sua sala, o prédio e a maneira como ele se sentiu incentivado durante o curso marcaram bastante. “Tem músicas que eu ouvia na Panamericana que quando eu escuto hoje eu me teleporto para as aulas. É interessantíssimo. Para mim foi um momento muito especial, a escola era um lugar muito agradável, que criava uma ambientação para o trabalho artístico, e o grupo de alunos da minha turma era muito bom também. Cheguei até a ganhar um prêmio na época, de honra ao mérito, por alguns trabalhos. Como eu já tinha desenhado antes, as aulas serviram para eu me desenvolver melhor. Aproveitei bem esse tempo que, embora curto, foi muito denso”.

Depois de terminar o curso da Panamericana, Anderson viajou o mundo como missionário de uma congregação com origem na França e na Holanda, e fez cursos curtos de artes em instituições como a escola Restauro de Roma, o Instituto Italiano de Arte Artigianato e a Academia de Verona. O artista, cuja formação filosófica e teológica refletem nas temáticas sociais, populares e religiosas das suas obras, participou de intercâmbios de arte e cultura pela paz e integração entre os povos junto à organização de solidariedade italiana, Ca”Forneletti. Na volta ao Brasil, se tornou um dos idealizadores da Casa de Cultura Cidade de Deus, no Rio de Janeiro, onde morou por sete anos.

Da escola onde estudou arte pela primeira vez, o artista guarda muitas boas lembranças: “Uma das coisas que mais me marcou foi a qualidade das aulas, a seriedade, a dedicação, o empenho dos professores. A gente via que era uma escola que tinha essa preocupação com a qualidade da informação. Fiquei feliz pelo reconhecimento também. Quando a Panamericana valorizou o trabalho que eu fazia, isso foi um incentivo para mim, porque eu vinha do interior e não tinha referências. A preocupação com a preparação para a criação também foi fundamental. Eu sou um pouco ansioso, então essa coisa das etapas do processo, do cuidado, da limpeza do trabalho, de você se preocupar muito com as linhas foi muito importante. Hoje o meu trabalho é muito marcado pelas linhas e eu acho que tem muito a ver com essa base que eu recebi na Panamericana. O dia de ir para a escola tinha uma aura especial. Lembro de um dia que eu fui com tanta vontade, que esqueci o dinheiro, esqueci a carteira e fiquei parado no metrô da Paulista e sem ter como voltar. Precisei da ajuda de um senhor. Então eu acho que esse clima de prazer de estudar ali me marcou bastante”.

Durante a pandemia, Anderson aproveitou para rever suas obras e reorganizar seu atelier na serra. “Nós moramos numa comunidade de agroecologia, então acho fundamental criar um atelier que trabalhe em comunhão com a natureza. Nós temos aqui um desafio de preservação de um patrimônio histórico muito importante. Além disso, participei de um projeto chamado ‘Desenhar Cada Dia’. A gente se reunia para motivar as pessoas a criarem e a desenharem em tempos de pandemia. E assim a gente foi incentivando as pessoas a fazerem da arte um momento de autossuperação, de resgate da saúde mental. Porque a arte te propicia sentir. Você pode ler um texto, mas se você ouvir uma música com aquele texto, se ouvir um monólogo de um artista, ou vir um quadro pintado a partir daquele texto, a arte te provoca algo muito mais profundo. Então, eu acho que a arte é o caminho. Agora, é claro, eu acho que a arte precisa ser associada à educação, ao conhecimento, senão ela se transforma numa arma que pode ser utilizada tanto por quem quer libertar e trazer a dignidade, como por quem quer oprimir também”, reflete.

Para as pessoas que têm dúvida sobre a possibilidade de viver de arte, Anderson aconselha: “A vida é essencialmente um risco e só vive quem se arrisca. A vida é uma só e a gente tem que viver a nossa verdade. Não dá para viver assim pela metade, né? Viver da arte também é possível. A gente pode sofrer com parte econômica, mas ao mesmo tempo a gente vai descobrindo caminhos onde a riqueza está em determinadas qualidades do modo de viver. Você pode querer juntar, juntar, trabalhar, trabalhar, trabalhar até se matar para um dia viver bem, ou você pode optar por viver bem e buscar recursos que te dão a qualidade de vida. Então, eu acho que se tem um pouquinho de paixão, é importante alimentar essa paixão. Conheça outros artistas, se dedique a contemplar a vida através da arte e faça com que ela faça parte do seu cotidiano”, finaliza.

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