Artista plástico bem-sucedido, ex-aluno da Panamericana relembra sua trajetória

Rien fala sobre a importância da escola para a sua carreira e sobre como resolveu largar a carreira de redator publicitário para se dedicar às artes plásticas

Com obras espalhadas por mais de dez países no mundo, o artista plástico Henrique Tomaz, mais conhecido como Rien, teve seu primeiro contato com a arte aos 14 anos, quando começou a pichar muros junto com os amigos de adolescência. “Eu era um garoto de 14 ou 15 anos e eu comprei um spray para pintar bicicleta e resolvi pichar meu nome nos muros da vizinhança, onde não passava ninguém. Era uma coisa bem infantil, mas aquilo me deu uma sensação legal. Eu nunca tinha tido contato com tinta de maneira criativa e, mesmo sendo apenas um nome na parede, aquilo me despertou uma adrenalina. Era como uma quebra de barreira, até porque eu nunca tive na família esse lance de incentivo à arte e cultura porque meus pais são de outra linha, outra vivência. Eu não era uma criança que desenhava, mas comecei a me interessar por aquele universo”, relembra ele.

A adrenalina de transgredir as regras pichando seu nome em muros não foi suficiente e ele logo se interessou pelo grafite e pela técnica de desenhos em stencil: “Chegou um momento em que só escrever meu nome não me satisfazia e eu queria fazer coisas mais legais. Só que eu tinha uma desabilidade muito grande para desenhar. Então eu pensei: “Como eu posso fazer uma coisa tão genial como a galera faz?”. Foi quando eu descobri que existia uma técnica que se chamava stencil e resolvi pesquisar. Naquela época já tinha internet, mas de uma maneira bem escassa, não tinha tutorial, não tinha nada. Fui pegando o jeito de curioso e fui fazendo da minha forma. Daí, de fato, eu comecei a ter contato com grafite, com a galera que fazia realmente parte do movimento de rua, de pintar na rua, do movimento do stencil, que também é um movimento separado, e fui desenvolvendo o gosto por pintar, por conseguir me expressar de forma livre. Fazendo stencil eu consegui entender que eu poderia fazer literalmente o que eu quisesse e que a minha falta de habilidade no desenho não era um impeditivo”, conta Rien.

Além de participar de eventos de grafite e stencil, o jovem também era músico, integrava uma banda, mas na época não achava que poderia ser possível viver de arte. Por isso, antes de investir na carreira de artista plástico, ela cursou faculdade de Publicidade e Propaganda, e trabalhou como redator por algum tempo em agências. “Eu sempre pintei em paralelo, nos finais de semana, porque era o que eu gostava. Meu hobby. Mas aí chegou um momento em que eu comecei a sentir que a vontade que eu tinha de pintar era maior do que a vontade que eu tinha de ler para escrever, ou de entender o mercado para trabalhar e investir na carreira de publicitário. Foi um ‘turning point’, porque naquele momento eu percebi que ser artista era o que eu queria da vida”, diz.

Foi nessa época que o artista decidiu largar a faculdade de Publicidade e Propaganda inacabada e cursar Design Gráfico na Panamericana: “Eu decidi que iria correr o risco de tentar ganhar dinheiro fazendo o que eu realmente gostava. Larguei a faculdade e me matriculei na Panamericana, porque no círculo de pessoas com quem eu convivia e nos ambientes em que eu convivia culturalmente, a escola era vista como um centro artístico. Era o ambiente em que todo o mundo criava muito, em que os professores eram criativos e a galera pensava diferente. Aí eu decidi que era lá que eu queria estudar, mas ainda assim meio conservador demais, fui fazer Design Gráfico. Pensei que assim eu conseguiria entender um pouco sobre composição e sobre algumas coisas legais, mas também me manter meio resguardado caso tudo desse errado. Com o curso de Design Gráfico eu poderia voltar a trabalhar em agências com um background um pouco maior, sabe?”.

Quando ingressou na Panamericana, Rien já estava vendendo algumas de suas obras e participando de alguns eventos de arte: “Eu já tinha até um público. Mas foi na escola que eu comecei a ter contato com outras pessoas, com outras cabeças. As experiências que eu tive ali me deram uma alavancada, e aí, no meio do curso eu já tive certeza de que a decisão certa era largar tudo e realmente viver de arte”.

Apesar de ter optado pelo curso de Design Gráfico e ter se tornado artista plástico, Rien conta que tudo o que aprendeu na escola foi muito importante para a construção de sua carreira. “A metodologia da escola foi muito legal para mim. Porque eu consegui entender na prática os princípios de luz e sombra, de técnicas de design e entender algumas coisas muito importantes para a concepção artística. Independentemente do que você vai criar, é legal você ter uma base dos diferentes caminhos que existam e isso foi muito importante para o meu trabalho. Eu comecei desbravar mundos que eu não tinha a mínima noção de que existiam. Eu não conhecia quase nada daquilo. Então ali eu comecei a emergir em outro universo”, explica.

Rien também lembra com carinho dos professores da Panamericana e dá a eles crédito por incentivarem sua criatividade: “Os professores também foram um fator muito importante para mim. Eles foram muito geniais. Tanto que até pouco tempo, antes de começar a pandemia, eu encontrei com alguns deles. A gente foi tomar cerveja, o que é uma coisa muito legal. Os caras foram muito incentivadores do meu trabalho. Eu chegava na aula e falava: “Pô, professor, eu estou fazendo isto, estou fazendo aquilo”, e eles me incentivavam, davam toques. Essa relação foi muito bacana para eu ir moldando a minha visão de criativo, para pensar como aquela galera pensava. A didática dos professores era uma didática muito profunda. Hoje, depois de muitos anos produzindo e adaptando minha própria técnica, a questão visual, eu acho que eu lido muito mais comigo, com as minhas vivências, com as minhas metáforas, na medida do que eu quero fazer. Mas de certa forma, a maneira como eu penso vem muito do que eu aprendi na escola e eu devo muito à visão cultural e artística que a Panamericana proporcionou, talvez, até indiretamente”.

Rien conta que até hoje tem os materiais e trabalhos que realizou na Panamericana guardados: “São memórias muito legais porque a escola incentiva que você faça algo bacana, que você faça algo seu. Os professores sempre diziam: “não tem certo, não tem errado, faz”. E isso é realmente bem expressivo da didática da Panamericana. Sempre fiquei muito livre lá, e isso era o que me dava mais tesão. Não tinha uma regra quadrada. Se tivesse, isso poderia ter me bloqueado um pouco. Eu já tinha a desabilidade de não saber desenhar, então, eu acho que eu teria perdido um pouco o interesse. Então, era uma relação que me impulsionava, era o incentivo que eu precisava”, relembra.

Quando concluiu o curso da Panamericana, Rien já havia feito a transição completa de carreira e já era artista contratado em uma galeria paulista. Além de participar de muitas feiras, exposições, eventos e bienais no mundo tudo, o artista montou seu próprio ateliê e ganhou notoriedade no meio artístico. Desde 2017, ele administra sua própria carreira que segue em ascensão. “Comecei a desenvolver esse lado empreendedor de fazer contatos, de falar com pessoas e aí gradativamente eu fui fazendo trabalhos para marcas e me conectando com outras personalidades. Hoje o meu trabalho é muito guiado por essa tomada de decisão de tomar as rédeas do meu trabalho, lá atrás”.

Com retratos de diversas personalidades em seu portfólio, o artista classifica seu trabalho atual como um “realismo expressivo”: ” Hoje eu vivo uma outra vertente do meu trabalho, que é uma vertente um pouco mais comercial, de encomenda de retratos. Mas uma das coisas que eu mais gosto em meu trabalho é a expressão que eu trago dos traços do grafite, da rua, que foram marcantes no que eu fazia desde o início. Como eu fazia com spray, com estêncil, então eu tentava usar o máximo, explorar o máximo daquela ferramenta. O spray é naturalmente para ser preenchido, mas existem outras técnicas ali que você desenvolve para que tenham uma textura diferente, tenham um visual diferente. Então o meu trabalho tem esse movimento, essa expressão. Eu faço um trabalho muito detalhado, muito meticuloso para conseguir ter um realismo vivo e impactante, mas eu consigo destruir aquilo de alguma forma com spray depois”.

Totalmente realizado com a sua profissão, Rien conta que a arte é tudo para ele: “Eu sou artista de coração, eu sou artista de alma, eu vejo o mundo diferente, eu vejo as coisas de maneira diferente, eu me toco com coisas diferentes. Eu sou artista, então eu descobri uma maneira de me expressar assim, e isso é só uma técnica. Amanhã eu posso fazer escultura, eu posso fazer teatro. A arte para mim é a base da maneira que eu enxergo o mundo. A arte que me deu basicamente tudo que eu tenho, tudo que eu conquisto, tudo o que eu vejo, tudo que eu vivo. É isso, arte para mim é um dos grandes pilares de quem eu sou”.

Questionado sobre o que diria para alguém que tem vontade de mudar de carreira e viver de arte, Rien aconselha manter o foco no que se ama, mas com planejamento. “Se tudo der errado hoje na minha vida e eu tiver que ser qualquer outra coisa que não artista, no final de semana eu vou pintar. Porque é isso que eu gosto de fazer. Se eu posso fazer isso e tentar uma forma de ganhar dinheiro com isso, eu vou fazer até o ponto que eu conseguir. Então o meu conselho é: se organize, obviamente, mentalmente, emocionalmente e financeiramente, mas faça. Foque no que te faz bem, no que você ama. Eu acho que quando você foca só no dinheiro, em algum momento você vai ficar infeliz, de uma forma ou de outra. Se você acredita de verdade, se você acha que você tem um potencial, ou se você tem um tesão muito grande naquilo, vá em frente, que uma hora aquilo vai dar certo, você vai se adaptar. Meu conselho é: vá pra cima daquilo que você gosta, o seu ‘eu’ do futuro vai te agradecer muito”, finaliza.

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